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Os paralelepípedos de Itaboraí: um calçamento alinhado à sustentabilidade e a história da cidade

Escrito pelo prof. Dr. Gilciano Menezes

No final de janeiro de 2024 a Prefeitura Municipal de Itaboraí começou asfaltar, sem consulta popular, as ruas com paralelepípedos localizadas na região do Centro Histórico da cidade e nas ruas próximas. Por vários motivos, esse episódio causou surpresa e perplexidade em muitos itaboraienses.

Trabalhadores da Prefeitura de Itaboraí retirando parte dos paralelepípedos

Fonte: Instagram do MDPHI [1]

Essa iniciativa vai na direção oposta de um projeto de mobilidade urbana que preze pela sustentabilidade na região, pois desconsiderou que os paralelepípedos viabilizam a permeabilização do solo, através dos espaços existentes entre os blocos, na medida em que diminuem a vazão de água das chuvas, reduzindo, dessa maneira, os riscos de alagamentos e enchentes. Soma-se a isso o fato de que os poucos bueiros dessas ruas não recebem a manutenção devida, o que torna a continuidade da pavimentação por paralelepípedos uma necessidade prioritária. Cabe mencionar também que os paralelepípedos refletem a luz e facilitam a dispersão do calor, visto que estão enterrados no solo.

Ao contrário da malha asfáltica, que se deteriora em um curto espaço de tempo, os paralelepípedos apresentam maior durabilidade. Contudo, requer manutenção devida em suas estruturas, o que por longa data não foi realizada.

Outra questão, trata-se do fato de que os paralelepípedos inviabilizavam o tráfego em alta velocidade de automóveis e motocicletas, como o que está ocorrendo agora com a malha asfáltica na Rua Doutor Macedo, onde está localizado o Colégio Estadual Visconde de Itaboraí, local onde muitas crianças e adolescentes atravessam de segunda à sexta para irem estudar. 

Chama atenção também a completa falta de sensibilidade da atual Prefeitura com a preservação dos espaços de memória localizados no Centro Histórico e nas regiões próximas. Vale destacar que o calçamento por paralelepípedos na região foi iniciado em 1944, na gestão do Prefeito João Augusto de Andrade. A Travessa Espírito Santo foi o primeiro espaço na cidade que recebeu esse tipo de pavimentação [2].

Em 1953, sob a gestão do Prefeito Roberto Pereira dos Santos, ocorreu o término das obras de remodelação da Praça Marechal Floriano Peixoto (atual Centro Histórico), momento em que o calçamento de paralelepípedos nessa praça foi finalizado. Segundo o jornal O Itaborahyense, esse calçamento representou “uma moderna urbanização” realizada em uma cidade do Estado do Rio de Janeiro. No decorrer da década de 1950 e 1960, os paralelepípedos foram instalados nas ruas ao redor dessa praça. Logo, além da história existente em torno desse calçamento, nota-se a durabilidade de suas estruturas, na medida em que sua instalação na cidade foi iniciada há quase 80 anos [3]. Apesar do tempo e da falta de manutenção devida, esses paralelepípedos estavam em um bom estado de preservação.

A ação de colocar malha asfáltica em ruas do Centro Histórico representou uma expressiva demonstração de desrespeito à História de Itaboraí. Além da Prefeitura não ter considerado a memória coletiva dos itaboraienses sobre esse local, ignorou o fato de que na Praça Marechal Floriano Peixoto estão localizadas edificações tombadas pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (INEPAC), como a antiga Câmara Municipal, e pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), como a atual Prefeitura e a Igreja Matriz de São João Batista de Itaboraí [4].

Área atrás da Igreja de São João Batista

recebendo o asfalto por cima dos paralelepípedos

Fonte: Instagram do MDPHI [5]

O bom senso preservacionista e algumas legislações estabelecem que não se altera o entorno próximo de bens tombados, sobretudo de patrimônios reconhecidos pelo IPHAN. Dessa maneira, o asfaltamento realizado por cima dos antigos paralelepípedos atrás da Igreja Matriz é uma gritante demonstração de desconhecimento dos cuidados devidos com esses patrimônios e de falta de sensibilidade com a História de nossa cidade.

Ainda que não tenha uma legislação específica que impeça o asfaltamento sobre os paralelepípedos das outras ruas próximas ao Centro Histórico, tal iniciativa, para além dos motivos já apresentados neste texto, se choca com a percepção coletiva de preservação de uma parcela significativa de moradores da cidade, visto que desconsideraram o valor imaterial que esses espaços possuem e que essas pessoas compartilham.  

Enquanto municípios próximos, como Cachoeiras de Macacu, têm realizado pavimentações de ruas com paralelepípedos para, entre outros motivos, facilitar o escoamento das águas das chuvas e com isso implementar uma mobilidade urbana que esteja inserida na perspectiva da sustentabilidade, Itaboraí regride em prol de uma falsa percepção de progresso, pois não considerou que a manutenção da pavimentação de paralelepípedos atende a diversas demandas prioritárias dos moradores da cidade, não se restringindo apenas ao aumento da velocidade do tráfego de veículos e motocicletas pela cidade.

Funcionários da Prefeitura de Cachoeiras de Macacurealizando o calçamento com paralelepípedos

Fonte: Facebook da Prefeitura de Cachoeiras de Macacu [6]

Diante de todo esse contexto, diversos moradores passaram a se reunir em prol da preservação dos Patrimônios materiais e imateriais da cidade, criando, dessa forma, o Movimento em Defesa dos Patrimônios Históricos de Itaboraí (MDPHI). Diversas ações no plano pedagógico e jurídico estão sendo desenvolvidas para impedir a continuidade do descaso e da depredação dos patrimônios e da História de nosso município. Portanto, trata-se de um movimento criado pelo entendimento de que o progresso é compatível com a preservação e com a valorização da História de nosso querido Itaboraí, algo que a atual Prefeitura de Itaboraí precisa compreender!

Bibliografia:

[1] Fotografia tirada no final de janeiro na rua Salvador de Mendonça. Disponível em: https://www.instagram.com/p/C3HG8ifuPYM/?img_index=8. Acesso em 20 fev. 2024.

[2] Informações extraídas da placa de Inauguração da área de lazer na Travessa Espirito Santo.

[3] O Itaborahyense. Itaboraí, 2 ago. 1953; Idem. 20 ago. 1953.

[4] COSTA, Gilciano Menezes. Patrimônios tombados em Itaboraí. 23 jun. 2014. Disponível em: https://www.historiadeitaborai.org/patrimonios-tombados. Acesso em: 20 fev. 2024.

[5] Disponível em: https://www.instagram.com/p/C3HG8ifuPYM/?img_index=5. Acesso em: 20 fev. 2024.     

[6] Facebook da Prefeitura de Cachoeiras de Macacu. Disponível em: https://www.facebook.com/photo/?fbid=2540012572811799&set=pcb.2540012879478435. Acesso em: 20 fev. 2024.

Acesse para saber mais sobre o projeto História de Itaboraí e região



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