Texto de: Gilciano Menezes Costa
A Igreja de São João Batista, em destaque na fotografia realizada em 1920, representa um dos principais expoentes do catolicismo em Itaboraí [1].
Segundo Monsenhor Pizarro, a origem dessa igreja está associada à Capela de Nossa Senhora da Conceição, construída “na fazenda que foi de João Corrêa da Silva, em Iguá [Venda das Pedras], distrito de Tapacorá (…).” Nessa Capela foi criado o curato, em 1627, e com o decorrer dos anos suas funções religiosas foram transferidas para a Capela de São João Batista, erigida em uma colina, com paredes de pau a pique, por João Vaz Pereira, a qual já estava pronta em 1672. Pizarro argumentou que um dos motivos dessa transferência do Curato se deu pelo fato da Capela de São João Batista ser maior. Supõe-se também que o fluxo de pessoas que circulavam nessa localidade em busca de água potável, devido à presença de uma fonte nas proximidades, tenha contribuído para essa modificação [2].
Em 1679 foram iniciados nessa capela os exercícios de curada, tornando-se independente da Matriz de Santo Antonio de Sá. Foi através do Alvará de 18 de janeiro de 1696 que ocorreu sua elevação à categoria de paróquia (freguesia). Cabe mencionar que, no ano de 1697, a Freguesia de São João Batista de Itaboraí passou a fazer parte da recém criada Vila de Santo Antonio de Sá [3].
Conforme argumentou Pizarro, “para que se construísse um templo digno de servir de Matriz”, foi determinado, pela Carta Régia de dezembro de 1699, que a Fazenda Real contribuísse anualmente com duzentos mil réis e que os fregueses (moradores da freguesia) se responsabilizassem com cem mil réis por ano até sua conclusão. Porém, segundo ele, “a despesa então feita na capela antiga, e primeira de São João, foi de pouco proveito, por não se construir com paredes duráveis e capazes de resistir às injúrias dos tempos” [4].
Diante disso, em janeiro de 1725, o já citado João Vaz Pereira iniciou a construção da nova igreja, “distante 20 braças da primitiva, sob a mesma invocação”. Tais obras foram concluídas apenas em 1742. Outro nome que se destacou, nesse contexto, é o de Domingos Vaz Pereira por ter doado as terras onde a Igreja foi construída. Além destes, a contribuição dada pelo Capitão Manuel Antunes Ferreira, a partir de 1729, foi determinante para a continuação e a conclusão dessas obras [5].
Desde o período colonial as Igrejas se constituíam em espaços de socialização, que iam além da vida religiosa e a ajuda dos moradores em suas edificações ocorriam com uma certa frequência. [6].
Assim, pelo testamento do Mestre de campo Miguel Antunes Ferreira, filho do capitão Manuel Antunes Ferreira e D. Catharina de Lemos e Duque-Estrada, consta que a Igreja Matriz de São João Batista de Itaboraí recebeu também a cooperação de D. Catharina “com dinheiro, madeira, pedra, carro e escravos”. Para ela, foi concedido um altar, onde “D. Catharina colocou N. S. do Pilar” e “sepultura para si, seus filhos, e netos e mais descendentes”. [7]
Dessa forma, parte dos escravizados que construíram a Igreja Matriz de São João Batista de Itaboraí pertenciam ao capitão Manuel Antunes Ferreira, que era senhor de engenho em Tapacorá. Para os preceitos da época, esses indivíduos foram enviados por sua esposa como um gesto de devoção religiosa ao catolicismo.
Vale destacar que o envolvimento desses escravizados na construção da Igreja, possivelmente, não se realizou apenas pelos mandos de seus proprietários e tampouco se restringiu à devoção religiosa, na medida em que o trabalho dessas pessoas, nessas obras, constituiu-se em solo fértil de negociação e, logo, de busca pela liberdade.
Outras obras de ampliação da Igreja de São João Batista ocorreram pelos anos de 1767, 1772 e 1782, momento em que se concluiu a estrutura que mais se aproxima da atual. Existem diversas menções elogiosas da edificação desse templo. Por exemplo, Pizarro relatou, no final do século XVIII, que essa Igreja foi reedificada com “perfeição e [que era] das melhores do Recôncavo.” De forma semelhante, mas na segunda metade do século XIX, o romancista Joaquim Manoel de Macedo mencionou que a “Igreja Matriz é uma das melhores e mais espaçosas da província” [8].
Durante os séculos XVIII e XIX, a Igreja Matriz de São João Batista foi um dos espaços de maior dinamismo social e político da Vila de Itaboraí. O cotidiano da ritualística de batismos, casamentos, óbitos, entre outros, possuía um caráter público (para além do religioso), onde laços de sociabilidades e hierarquias sociais eram reafirmados. Além disso, eram realizadas eleições municipais e provinciais na própria paróquia [9].
Em 1970, a Igreja Matriz foi tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), evidenciando, dessa forma, a sua relevância histórica e arquitetônica [10]. Portanto, como pôde ser observado, a Igreja de São João Batista possui uma importância para além do âmbito religioso, destacando-se também na esfera patrimonial e na história do próprio município de Itaboraí.
Bibliografia:
[1] Registro iconográfico de autoria do célebre fotógrafo Augusto César Malta Campos e pertencente ao acervo do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro (AGCR).[2] ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro e (Monsenhor). O Rio de Janeiro nas visitas pastorais de Monsenhor Pizarro: Inventário da arte sacra fluminense. 1753 – 1830. RJ. INEPAC. 2009. Vol. II. pp. 223-245. ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro e (Monsenhor). Memórias Históricas do Rio de Janeiro. RJ. Edição original, 1820, Imprensa Régia. Livro II. pp. 199-209.[3] Ibidem.[4] Ibidem.[5] Ibidem.[6] SOARES, Mariza de Carvalho Soares. Devotos da Cor: identidade étnica, religiosidade e escravidão no Rio de Janeiro, século XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000. p. 135. [7] Testamento do Mestre de Campo Miguel Antunes Ferreira. 12 de fevereiro de 1781.[8]Grifo meu;ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro e (Monsenhor), op. Cit., p. 200; MACEDO, Joaquim Manuel de. O Rio do Quarto. Rio de Janeiro: casa dos proprietários Eduardo & Henrique Laemmert, 1869, p. 8.[9] Essa afirmação é constatada pela leitura dos registros paroquiais do século XVIII da Igreja de São João Batista de Itaboraí e pelos periódicos impressos publicados na região no século XIX.[10] Nº do processo de tombamento pelo IPHAN: 0616-T-60 – Livro Histórico Nº inscr.: 425; vol. 1; f. 069; data: 18/03/1970.

Colunista: Gilciano Menezes Costa, formado em História pela UFF, com Mestrado e Doutorado pelo PPGH-UFF. Professor de História, Filosofia e Sociologia na rede estadual de ensino em Itaboraí. Idealizador do projeto História de Itaboraí e Região.